'Anônimo 2' diverte ao repetir tudo o que deu certo no filme anterior
- Guilherme Cândido
- há 7 dias
- 4 min de leitura

Embora impactado pelas limitações de distribuição no período pandêmico, Anônimo fez sucesso junto ao público, especialmente por se tratar de uma comédia de ação surpreendente em vários aspectos. No âmbito narrativo, apresentou um pai de família aparentemente impotente que se revelava um implacável assassino aposentado, uma reviravolta potencializada pelo humor trazido por Bob Odenkirk. Que, por sua vez, representava a maior surpresa de todas: comediante de origem, o ator mostrou versatilidade ao enveredar pelo drama, marcando época e colecionando prêmios ao imortalizar o personagem Saul Goodman, primeiro na obra-prima da TV Breaking Bad (2008-2013) e depois em sua própria série derivada. Não satisfeito, Odenkirk seguiu os passos de Liam Neeson e, aos 59 anos, se reinventou como astro de ação na pele de Hutch, ex-agente do Governo sufocado pela rotina suburbana e que aproveita cada segundo do seu retorno à ativa. Além de ver Saul Goodman cruzando os dedos na esperança de ser provocado por bandidos, outro prazer oferecido por Anônimo eram as sequências de ação inventivas dirigidas pelo especialista Ilya Naishuller, cujo toque de mestre transparecia na ótima trilha sonora.

Agora sem o elemento surpresa, Anônimo 2 ganha um merecido lançamento mundial nos cinemas e, mesmo que seja eficaz ao entregar entretenimento rápido e objetivo, troca o frescor narrativo pelo tradicional tratamento que as continuações recebem de Hollywood.
Com exceção da duração, ainda abaixo dos noventa minutos, tudo aqui é maior: a quantidade de vilões, a participação dos familiares, as subtramas, o envolvimento de terceiros e, claro, a violência. O modelo narrativo utilizado no primeiro filme é empregado como uma fórmula de sucesso a ser seguida, com as várias repetições sendo embaladas como referências potencialmente nostálgicas, mas que dependerão da boa vontade do espectador para serem bem recebidas. Quem deseja um repeteco do que gostou de ver em 2021, não terá do que reclamar, por outro lado, os que esperam por novidades terão uma experiência incompleta.

Na trama, Hutch (Odenkirk) é obrigado a trabalhar dobrado para pagar a dívida pelos estragos causados durante seu embate com a máfia russa, o que afeta diretamente seu relacionamento com a família, principalmente Becca (Connie Nielsen), esposa que o aguarda diariamente para jantar e acaba frustrada. Determinado a se redimir, ele planeja tirar férias, levando até seu pai (Christopher Lloyd) para passar uns dias no mesmo parque aquático do qual guarda boas memórias. O problema é que o local agora é usado pela vilanesca Lendina (Sharon Stone) como fachada para atividades criminosas, algo que Hutch será incapaz de tolerar.

Bob Odenkirk faz jus ao tratamento vip que recebe do roteiro assinado por Derek Kolstad (o mesmo do anterior e criador de John Wick) e Aaron Rabin (da série Jack Ryan), mantendo a segurança com que encara várias lutas brutais e adicionando personalidade ao desconstruir a imagem do herói de ação. O efeito colateral de ser a atração principal, é a restrição do espaço dado ao restante do elenco, pois, além do excesso de personagens, há quem surja em cena apenas para marcar presença, proferindo duas ou três frases e protagonizando uma ou outra sequência de ação.

Aliás, a direção dessa vez fica por conta de Timo Tjahjanto, mas apenas em caráter figurativo, pois o estilo sanguinário e cru visto em obras como o bom Headshot (2016) e o netflixiano A Noite nos Persegue (2018), é diluído numa decupagem mais próxima da franquia John Wick. Como mão de obra contratada, o indonésio empresta sua grife para apenas mimetizar a abordagem visual de Chad Stahelski e David Leitch (presente como produtor), resultando em set-pieces competentes (especialmente aqueles que absorvem o humor de Odenkirk), mas carentes de uma assinatura. Em outras palavras, falta a esta continuação uma luta como aquela da obra de 2021 que acontece no interior de um ônibus. E/ou um tiroteio com o mesmo nível de intensidade apresentado no clímax anterior. E por falar em clímax, até o momento Esqueceram de Mim que marcou o confronto final de Anônimo é recriado, mas se Ilya Naishuller sabia disfarçar o orçamento limitado de sua produção, aqui nos deparamos com a natureza artificial do fogo, por exemplo.

Apesar de todas essas ressalvas, Anônimo 2 é plenamente capaz de divertir o seu público. Senão com o brilhantismo de seu original, agora através do caráter familiar que cerca as decisões de Hutch, em passagens que afastam a narrativa da ação desenfreada pós-moderna e relembra os clássicos brucutus da década de oitenta, que apelavam para o lado selvagem da audiência masculina ávida por se sentir representada por atos de vingança embebidos em sangue. É o caso da longa sequência que sucede um tapa dado na filha de Hutch e do laço forjado com o Wyatt Martin de John Ortiz.

Previsível na forma como espalha seus personagens com o intuito de reuní-los ao final, mas com o bônus de trazer Sharon Stone na pele de uma psicopata entusiasta de passos de dança, Anônimo 2 fica distante de seu excelente antecessor, mas não ao ponto de perder de vista o que agrada aos fãs da franquia.
NOTA 7