Com grande atuação de Andréa Beltrão, "Ela e Eu" reflete sobre memórias
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  • Foto do escritorGuilherme Cândido

Com grande atuação de Andréa Beltrão, "Ela e Eu" reflete sobre memórias


À primeira vista, o principal elemento de Ela e Eu que salta aos olhos do espectador é a atuação majestosa de Andréa Beltrão. Atriz que há mais de 30 anos nos presenteia com seu talento inquestionável colocado à serviço das mais variadas Artes, Beltrão investe numa composição extremamente corajosa e delicada, evocando emoções complexas através de olhares e inflexões e captando gestos e trejeitos inerentes à condição de sua personagem. Afinal, Bia entrou em coma logo após o nascimento de sua filha e, 20 anos depois, acaba despertando para uma vida ressignificada ao lado da família que nunca a abandonou.


Diante de uma performance tão sensível e precisa, é difícil para o espectador não rasgar elogios à atriz carioca, capaz de provocar sensações distintas pronunciando frases aparentemente triviais ou convencendo plenamente na pele de alguém que está reaprendendo a viver após passar duas décadas apenas sobrevivendo. O andar trôpego e a fala vacilante são acompanhados de um olhar expressivo que por vezes é ofuscado pelo largo e vibrante sorriso estampado no rosto da personagem. Que não está sozinha.


Iniciando a projeção ao som de João e Maria, de Chico Buarque, Ela e Eu (título de uma canção de Caetano Veloso e também presente aqui) apresenta as imagens do parto fatídico, intercalando com a narração em off da jovem Carol enquanto aos poucos vão surgindo os demais personagens. Pois os protagonistas, integrantes de uma típica família carioca de classe média, fazem questão de manter Bia como uma espécie de receptáculo onipresente de memórias, acessadas esporadicamente. Quando a mulher desperta, porém, a dinâmica muda drasticamente.


Na pele da cuidadora de Bia, Karine Teles, fantástica no recente Benzinho, surge como um bastião da simpatia, uma pessoa tão cara a Bia justamente por possuir uma relação sem o compromisso do parentesco. Um relacionamento honesto e com um fim em si mesmo. O tipo de companhia perfeita para tomar uma cerveja enquanto as gargalhadas fáceis se misturam ao bate-papo. Já Eduardo Moscovis, outro carioca com três décadas dedicadas à atuação, confere calor humano e simplicidade ao patriarca da família, dividindo com Andréa Beltrão o melhor momento do filme, aquele onde Bia se entrega às lágrimas para agradecer ao antigo marido por todo o cuidado recebido.


Como é possível notar, o roteiro escrito pelo diretor Gustavo Rosa de Moura (Canção da Volta) em parceria com Leonardo Levis (O Filho Eterno) e a própria Beltrão, busca a emoção, mas sem desviar do prisma lúdico oferecido por Bia. Exatamente por isso, Ela e Eu seria um filme ainda mais poderoso caso se concentrasse exclusivamente na reconexão de Bia com o mundo a sua volta. Ao invés disso, o script acaba por diluir sua força em subtramas paralelas que, se não deixam de funcionar – graças à qualidade do elenco – também não chegam a alcançar o potencial narrativo almejado.


Nesse aspecto, à Renata de Mariana Lima (da série Magnífica 70), pouco sobra além de intrigas exploradas com certo desinteresse pelos roteiristas, como a noite de bebedeira pós-discussão e a sequência envolvendo o aniversário de Carol (Lara Tremouroux). Ambos os exemplos são esvaziados pela ausência de consequência, mas o segundo momento, ao menos, corresponde a um dos pontos altos da produção, onde a tensão crescente torna-se palpável através da troca afiada de provocações, culminando numa explosão raivosa onde Renata extravasa todo o estresse acumulado pela brusca mudança a qual sua vida se submeteu.


Mudança esta que é sutilmente abordada pela direção de arte, que utiliza os desenhos na parede do aposento de Bia para ilustrar a presença da mulher, mesmo enferma, no cotidiano da família e sua influência na vida de Carol (comprovada pela opção de cursar Neurologia). Mais tarde, porém, os mesmos desenhos são literalmente pintados por Bia, utilizando cores fortes para estabelecer sua nova situação psicológica.


Abordando as memórias como um refúgio ao mesmo tempo melancólico e acolhedor, ilustrado pelas inúmeras caixas que se convertem em depósitos de recordações, contendo desde fotografias a cartas, passando por objetos e ingressos de shows, os personagens de Ela e Eu jamais deixam de soar como pessoas de verdade e se acabam eternamente ligadas (não presas) ao passado, isso se dá pela enorme sensibilidade que demonstram possuir.


NOTA 8

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