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Em 'O Retorno', a odisseia do herói de Homero é intimista e atormentada

  • Foto do escritor: Guilherme Cândido
    Guilherme Cândido
  • há 2 horas
  • 3 min de leitura

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Um dos primeiros grandes trabalhos da Literatura Mundial, A Odisseia pode representar uma aventura e tanto em seu relato das batalhas travadas por Odisseu (ou Ulisses, seu nome romano), mas estranhamente não ganhou as telonas muitas vezes ao longo dos anos, como bem lembrou o cineasta Uberto Pasolini, ao afirmar que este seu O Retorno é a primeira adaptação da obra de Homero desde Ulysses, protagonizado por Kirk Douglas há exatos 60 anos. Talvez pelas dificuldades impostas pela grandiosidade do material, a verdade é que nem Pasolini se atreveu a contar a história na íntegra, focando apenas em seu ato final.


Assim, quando a projeção começa, a Rainha Penélope (Juliette Binoche) segue aguardando a volta de seu marido, cujo desaparecimento faz o trono ficar vago por tempo suficiente para que seus súditos a pressionem pela escolha de um substituto. Com o reino enfrentando várias crises, as opções se tornam mais escassas, a medida que a violência toma conta e enrijece os homens locais, algo que até o Príncipe Telêmaco (Charlie Plummer) reconhece. Dez anos se passam até Odisseu (Ralph Fiennes) finalmente retornar, mas carregando a culpa por ser o único sobrevivente da emblemática Guerra de Tróia, o que lhe motiva a esconder sua identidade ao viver entre os plebeus.

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Nada de grandes batalhas, momentos de bravura ou criaturas mitológicas, pois o que vemos em cena é um enfraquecido Odisseu hesitante em reocupar seu lugar ao lado da Rainha. Os roteiristas John Collee (Fúria Primitiva) e Edward Bond (Blow Up - Depois Daquele Beijo) se concentram nas severas debilidades físicas e psicológicas do guerreiro, que em seu calvário é forçado a entender a importância de seu papel na sociedade.

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Na prática, a produção funciona basicamente como um palco para dois grandes atores desfilarem seus talentos. Fiennes, magro e desgrenhado, é hábil ao ilustrar a fragilidade de Odisseu, mas também abraça a oportunidade de encarnar sua faceta combativa conforme nos aproximamos do final; ao passo que Binoche comove por transmitir o sofrimento que Penélope é obrigada a esconder, em mais um trabalho que comprova a incapacidade da francesa em oferecer performances no piloto automático. Discreto, mas eficaz, Plummer soma pontos ao se distanciar dos tipos problemáticos que costuma interpretar, enquanto Marwan Kenzari (The Old Guard 2) finalmente brinda o espectador com uma boa atuação, ao trazer nuances para Antínuoo.

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Infelizmente, o filme é prejudicado pela teatralidade excessiva, que compromete a maioria das sequências internas, com diálogos engessados em cenários visivelmente empobrecidos. Da mesma forma, os combates, mesmo esporádicos, são simplórios e filmados sem esmero, evidenciando a precariedade das coreografias. Inflexível em sua solenidade, Pasolini transforma O Retorno num exercício formal monocórdico, com lampejos de vivacidade injetados por seu elenco, sempre comprometido. Apesar de merecer créditos por sair de sua zona de conforto, o italiano, indicado ao Oscar como produtor de Ou Tudo Ou Nada (1997), nem de longe exibe a sensibilidade de Algum Lugar Especial (2020), seu filme anterior.

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Ao menos, o diretor de fotografia Marius Panduru (Não Espere Muito do Fim do Mundo) nos compensa com imagens absolutamente estonteantes ao captar as belezas naturais da ilha grega Corfu e da costa do Peloponeso, onde as filmagens aconteceram. Aliás, o próprio Castelo Chlemoutsi, usado como palácio de Odisseu, é engrandecido pelas lentes de Panduru.

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Trazendo problemas sonoros pontuais (especificamente em diálogos regravados), O Retorno oferece um olhar tímido sobre uma obra marcada pela grandiloquência e tenderá a ser esquecida quando Christopher Nolan lançar sua versão no ano que vem, desta vez adaptando a história completa e prometendo fazer jus à sua opulência.


NOTA 5,5

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