Festival de Cinema Europeu Imovision #6: "Emmanuelle"
- Guilherme Cândido
- 30 de abr.
- 3 min de leitura
Atualizado: 13 de mai.
Emmanuelle
(Idem, França)

O título é sugestivo, independentemente se você cresceu nos anos 1970 ou 2000. Criada pela escritora tailandesa Marayat Bibidh (1932-2005) em sua autobiografia The Joys of a Woman, Emmanuelle se tornou um ícone dos filmes eróticos, especialmente após o estrondoso sucesso do filme francês de 1974 estrelado pela holandesa Sylvia Kristel (1952-2012), o primeiro de uma série de produções que apenas esporadicamente trazia cenas de sexo explícito. Mas quando resolveu testar os limites do gênero, chegou a explorar masturbação e até uma infame sequência na qual uma dançarina fuma um cigarro sem usar a boca... Já o filme de abertura do Festival de San Sebastian 2024 e exibido neste Festival de Cinema Europeu Imovision é uma releitura moderna dos "clássicos" exibidos pela Band nas noites de sábado. Uma produção com traços feministas marcada por uma indecisão generalizada, já que a diretora Audrey Diwan fica num insosso meio-termo entre a seriedade do discurso sobre o desejo feminino e o escracho do pornô fajuto.

Vencedora do Leão de Ouro em Veneza pelo impactante O Acontecimento (2021), do qual pega emprestado alguns argumentos sobre a gerência da mulher sobre o próprio corpo, Diwan sintetiza seu revisionismo travestido de homenagem logo na primeira cena, com a protagonista viajando de primeira classe: Sem mostrar o rosto, ela ajeita a saia, num gesto de proteção ao olhar predatório do passageiro ao lado. Logo em seguida, porém, ela se levanta e caminha lentamente até o banheiro, deixando a porta entreaberta como um convite tácito ao suposto predador.

A Emmanuelle da vez é vivida por Noémie Merlant, atriz de 37 anos cuja performance no extraordinário Retrato de Uma Jovem em Chamas (2019), a transformou numa estrela internacional. Ela assume sem reservas o desprendimento demandado pelo papel, surgindo em momentos supostamente provocantes como aquele envolvendo uma câmera de celular e um cubo de gelo e outros que não fazem jus a uma das maiores intérpretes de seu país (uma cena de depilação íntima observada às escondidas).

Nossa heroína pode ter mudado de carreira, agora chefiando o departamento de controle de qualidade para os donos de uma rede de hotéis de luxo, mas as novidades param por aí. Pois seu trabalho é justamente o que a permite explorar a própria sexualidade, exatamente como no original. Era a chance de Diwan e a co-roteirista Rebecca Zlotowski (do bom Os Filhos dos Outros) concretizarem a ideia de desenvolver a personagem para além dos encontros carnais. Ironicamente, ao invés de um olhar contemporâneo e multifacetado, a dupla apenas reforça estereótipos, como o da ninfa superficial definida pela busca incessante pelo orgasmo.

É curioso, porém, que o melhor momento de Emmanuelle seja justamente aquele em que a mulher apenas conta sobre uma experiência sexual específica, num duelo verbal entre Merlant e Will Sharpe (o James de A Verdadeira Dor) em que a primeira exibe uma segurança inabalável ao rebater um interrogatório feito sob medida pelo segundo para tentar desequilibrá-la.

Tecnicamente a produção não vai longe. Além da trilha sonora banal de Evgueni e Sacha Galperine (da minissérie Bebê Rena), o diretor de fotografia Laurent Tangy (também de O Acontecimento) se atém à iluminação baixa e amarelada para acompanhar os ambientes estéreis. Ao menos a montagem de Pauline Gaillard (A Natureza do Amor) evita a cafonice de Cinquenta Tons de Cinza (2015-2018) na maior parte do tempo.

Enquanto isso, Naomie Watts (da obra-prima Cidade dos Sonhos) surge subaproveitada na tela, lutando para trazer sentido à sua escalação como a gerente do hotel. Inicialmente alimentando um potencial conflito com a heroína, Watts é vítima de roteiristas que parecem incertas quanto o propósito de sua personagem. Ela vai assumir a vilania ao finalmente confrontar Emmanuelle? Haverá uma redenção? Ou trata-se de uma mera tensão sexual a ser justificada por uma sequência de sexo? No final das contas, nem uma coisa, nem outra.

Exibindo furos dignos de um soft core, como (entre outros) ao ignorar o fato de que há alguém observando os movimentos da protagonista através das inúmeras câmeras espalhadas pelo estabelecimento (e que poderia abalar sua credibilidade profissional), Emmanuelle provoca mais bocejos do que excitação.
NOTA 3,5