'Zona de Risco' lida com os desafios da comunicação na era das distrações
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  • Foto do escritorGuilherme Cândido

'Zona de Risco' lida com os desafios da comunicação na era das distrações

Atualizado: 23 de fev.


Filmes de guerra de baixo/médio orçamento têm estreado com mais frequência que antigamente, tornando-se os queridinhos de produtores de filmes b. Posto de Combate, Alerta Máximo e O Pacto são apenas alguns exemplos dessa onda recente. Estreando sempre entre Janeiro e Fevereiro, uma época fraca do calendário cinematográfico por conta do inverno no hemisfério norte, essas produções têm se mostrado razoavelmente rentáveis, cooptando astros em decadência para capturar parte do público. Zona de Risco é mais um caso, desta vez escalando Russell Crowe e outros australianos para interpretarem militares estadunidenses (apesar de ter nascido na Nova Zelândia, Crowe se mudou ainda criança para o país vizinho).


O ex-Gladiador vive o Capitão Eddie “Reaper” Grimm, ex-piloto que após protagonizar repetidos casos de insubordinação acaba sendo relegado ao comando de drones, algo que o agrada, já que uma promoção o levaria ao posto de instrutor e o tiraria de vez do ar. É ele o encarregado de guiar um grupamento composto por "Sugar" (Milo Ventimiglia, da finada série This is Us), Bishop (Ricky Whittle, de Deuses Americanos), Abell (Luke Hemsworth, irmão mais velho de Chris Hemsworth, o Thor) e JJ. "Playboy" Kinney (Liam Hemsworth, irmão caçula de Chris e astro de Jogos Vorazes), que embarcam em missão por uma “zona de risco” nas Filipinas. Essa área é famosa por abrigar grupos extremistas tão perigosos que vários países costumam enviar tropas para o local, como se travassem uma guerra secreta (ou ao menos é o que garante a cartela que abre a narrativa).

Só por essa premissa já é possível antecipar a natureza derivativa do projeto, que não se envergonha da “inspiração” em outros filmes do gênero, especialmente Alerta Máximo (até a localização é semelhante). Infelizmente, o diretor William Eubank (dos razoáveis O Sinal e Ameaça Profunda), que também escreve o roteiro ao lado de David Frigerio (Crypto), faz pouco para contornar essa falta de imaginação, apostando em recursos visualmente datados (como câmera lenta) e narrativamente pouco originais originais, como a contagem regressiva que sempre acaba reiniciando, diluindo o impacto da atmosfera de urgência pretendida com sua inclusão.

Do elenco principal, o caçula dos Hemsworth, que há mais de uma década vem tentando emplacar em Hollywood, mas quase sempre acaba esbarrando em produções de baixa qualidade, como Independence Day 2, A Última Música e Conexão Perigosa, se sai bem como Playboy, um papel que, convenhamos, não exige muita aptidão dramática. A fisicalidade que ele traz e a experiência prévia interpretando personagens marcados pela juventude, contribuem para que o sujeito seja um protagonista pelo qual não vemos problemas torcer. Coincidentemente, seu colega de elenco Milo Ventimiglia é outro que buscou o panteão hollywoodiano durante toda sua carreira, chegando a bater na trave ao perder o papel de Bruce Wayne/Batman para Christian Bale. Mas se Liam teve de se contentar como par romântico de Katniss, ao menos Milo pode se gabar por ter capitaneado o sucesso televisivo This is Us.

Ventimiglia sempre se mostrou confortável em papéis como herói de ação, mesmo que dificilmente tenha mostrado o carisma necessário para chamar a atenção dos grandes estúdios, algo que não chega a comprometer por aqui, já que seu tempo de tela é limitado. E já que Luke Hemsworth aparece poucos minutos como um mero estereótipo, cabe a Russell Crowe roubar a cena como Reaper, mas não da forma que o projeto gostaria. Afinal, me vejo compelido a acreditar que o vencedor do Oscar só aceitou viver o capitão para poder pagar alguma dívida, pois sua participação beira o inacreditável.

Há uma tentativa embaraçosa de transformar Reaper no alívio cômico da história, uma ideia que já se provou fracassada em outros filmes, como o lamentável Thor: Amor e Trovão. O maior problema, na verdade, nem é essa decisão, mas sim a insegurança na hora de colocá-la em prática. Isso porque o ex-piloto até começa sustentando uma personalidade rabugenta com potencial para arrancar gargalhadas graças a uma gag deslocada, mas que Crowe tem a sorte de contar com o elemento surpresa (é sua primeira cena, vale destacar). Já o restante do filme aposta no personagem para manter uma ligação com o Playboy de Liam Hemsworth, construindo um elo emocional também com o espectador, mas que é abalado pela insistência em tentar usá-lo para forçar piadas (e a sequência com Reaper num supermercado é a maior prova desse equívoco). Como se já não bastasse o constrangimento de ver Crowe executando passos de dança com uma colega, é ainda pior vê-lo correndo para impedir um acontecimento, chamando a atenção para seu físico arredondado.


Essas distrações, coincidentemente, corroboram a principal tese do filme, dissertada sem muito traquejo pela dupla de roteiristas, mas cujo objetivo é cristalino: provocar uma reflexão sobre os ruídos de comunicação no mundo moderno. Nesse caso, as cenas que se passam no interior de uma instalação militar especializada justamente em comunicação não são dispostas à revelia, já que há uma intenção em expor indivíduos engolidos pelas distrações que os cercam. O fato de serem militares ainda possibilita um comentário ligeiramente mais sutil sobre o uso de drones na Guerra. Eubank e Frigerio, no entanto, deixam escapar um tom raivoso em sua resposta para o problema levantado, culminando numa sequência catártica que, aí sim, Russell Crowe mostra a que veio.

Claro que, tecnicamente, Zona de Risco se sai consideravelmente melhor, merecendo créditos por apostar em efeitos práticos ao invés do barato, mas potencialmente artificial CGI (as explosões arrancariam aplausos de Michael Bay). Da mesma forma, os tiroteios são intensos e o design de som potencializa o impacto do combate. Em contrapartida, é preciso reconhecer a dificuldade do diretor William Eubank em filmar as lutas, optando por planos fechados que transformam a troca de golpes num amontoado de cenas confusas e que não permitem ao espectador acompanhar as coreografias. As situações também carecem de imaginação, aplicando clichês para manter o espectador envolvido pelo suspense (o cachorro que quase denuncia a posição de Kinney; a corrida para fugir de uma explosão em cima da hora, o impulso para salvar uma criança; a bazuca que só aparece nas mãos do inimigo em momentos oportunos).

Após assinar filmes igualmente menores, mas superiores em quase todos os aspectos, Eubank não chega a ser um desastre em sua primeira vez comandando um filme de ação, mas deveria se preocupar com suas habilidades como roteirista. Pois ele e Frigerio abusam de conveniências ao pavimentarem os caminhos dos personagens, que desaparecem, reaparecem e são encontrados sem grandes explicações. Aliás, quando Playboy é capturado e alguém ressurge implacavelmente para salvá-lo na hora H e no meio da selva, gargalhadas ecoaram na sessão de imprensa onde eu estava.

Essas facilitações evidenciam a preguiça dos roteiristas e enfraquecem um filme que não consegue superar a média do que vem sendo produzido, mesmo demonstrando ambições tão modestas.


NOTA 5,5


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