CRÍTICA | "Homo Argentum"
- Guilherme Cândido

- há 6 horas
- 2 min de leitura
*Crítica publicada durante o Festival do Rio 2025

Apesar de conquistar o posto de filme mais visto na Argentina desde a retomada pós-pandemia, com mais de 1,7 milhão de espectadores, Homo Argentum coleciona polêmicas desde seu lançamento, a começar pelos elogio feitos por Javier Milei, presidente argentino, que fez questão de utilizá-lo como exemplo em seu discurso contra a “agenda hipócrita dos progressistas” e classificando-o como um ataque à “cultura woke”. Ironicamente, não faz muito tempo desde que Milei promoveu uma redução expressiva da verba destinada ao INCAA, Instituto Nacional de Cinema e Audiovisual, instituição governamental responsável pelo financiamento da produção cinematográfica argentina. Lembrando que nossos hermanos ostentam oito indicações ao Oscar de Melhor Filme Internacional, tendo vencido em duas oportunidades, em 1986 com o bom A História Oficial e em 2010 com o excepcional O Segredo dos Seus Olhos, protagonizado pelo gênio Ricardo Darín.

Já a recepção por parte da imprensa tem sido tremendamente desfavorável, apontando que a produção reforça estereótipos e apresenta uma visão exclusivamente portenha (o morador de Buenos Aires), escanteando a realidade das províncias e distorcendo a percepção acerca da classe trabalhadora. Independentemente da posição política, a verdade é que Homo Argentum é mesmo muito ruim.

Escrito e dirigido por Mariano Cohn e Gastón Duprat, inacreditavelmente a mesma dupla por trás dos estupendos O Cidadão Ilustre (2016) e Concorrência Oficial (2021) a narrativa é composta por dezesseis histórias que, separadas, parecem mais com esquetes exibidas no extinto Zorra Total (1999-2015) e juntas, uma bagunça desconexa que, de fato, reforça estereótipos. Nem mesmo o humor, de altos e baixos, ameniza o sofrimento de ver um artista multifacetado como Guillermo Francella emprestar sua credibilidade a uma coleção de caricaturas grosseiras.

A única “pequena história” (como a sinopse oficial se refere aos embaraços vistos na tela) que realmente funciona é justamente a primeira, trazendo Francella na pele de um milionário, que se pergunta porque um país com indivíduos tão bons não funciona coletivamente, fugindo após provocar dois atropelamentos, numa sátira construída com fortes doses de acidez e que é direto ao criticar tanto o individualismo quanto a hipocrisia do argentino médio, ao menos na visão de Cohn e Duprat.

De resto, piadas de cunho sexual (olha o Zorra Total aí), uma reprovável alusão a trabalhadores informais argentinos enganando turistas (brasileiros, no caso) e uma esquete envolvendo italianos roubando um portenho, que desperdiça o potencial de sua premissa, aproveitando dados históricos da imigração italiana ao país sul-americano.

Mesmo nos piores momentos (e acredite, não é fácil eleger apenas um), Francella está sempre se esforçando para manter o mínimo de dignidade possível, divertindo com visuais extravagantes e impressionando com performances que se diferenciam sem dificuldades. Repare como ele chega a falar com voz rouca na hora de interpretar um cineasta (numa esquete sem graça, mas que quase é salva por uma brincadeira com os tradicionais discursos socialmente responsáveis que dão o tom das grandes premiações) ou como adota uma postura curvada para encarnar um personagem específico.
Com tantos talentos envolvidos atrás e a frente das câmeras, a frustação consegue ser maior do que a incredulidade e nesse ponto me vejo na obrigação de concordar com meus colegas argentinos.
NOTA 3









