CRÍTICA | Predador: Terras Selvagens
- Guilherme Cândido

- há 12 minutos
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Apesar de ocupar um lugar de destaque na cultura popular hoje em dia, a franquia Predador sempre foi irregular nos cinemas. O primeiro longa, estrelado por Arnold Schwarzenegger em 1987, não foi exatamente um estouro de bilheteria, conquistando popularidade apenas nos anos subsequentes até alcançar o status cult que ostenta atualmente. De lá para cá, já tivemos filmes, livros e até quadrinhos alimentando a mitologia do Predador, mas sem de fato furar a bolha dos fãs, algo que finalmente deve acontecer graças a Dan Trachtenberg, que assumiu a marca após dirigir Predador: A Caçada (2022) hit do streaming. E ela não poderia estar em melhores mãos, uma vez que o cineasta não só demonstra paixão pelo universo do caçador intergaláctico, como sabe exatamente para onde quer levá-lo, promovendo uma série de mudanças com o intuito de atingir o público mainstream, da mesma forma que fez com a badalada animação Predador: Assassino de Assassinos, lançada há poucos meses na Netflix.

Se as narrativas anteriores traziam o Predador em participações esporádicas e sempre vinculado a algum personagem terráqueo, agora ele é promovido a protagonista de uma história completamente desprovida de humanos. Com isso, Trachtenberg tem a oportunidade de se aprofundar como nunca na mitologia do alienígena. Não por acaso, a projeção já se inicia em seu planeta-natal, mas sem apresentá-lo na versão implacável e quase invencível que nos acostumamos a ver nas telonas.

Esta nova aventura nos apresenta a Dek (sim, eles possuem nomes agora), jovem que precisa provar sua força a fim de ser aceito pelo clã, o que não chega a ser uma escolha, afinal, pois ao menos na cultura dos Yautja (como são chamados), ser forte é uma questão de sobrevivência, já que “a fraqueza deve ser eliminada”, como o líder do clã e pai de Dek faz questão de frisar logo em sua primeira aparição. E é claro que “provar força” significa caçar uma presa formidável, cujo crânio servirá simultaneamente como troféu e aceitação social.

O principal diferencial de Terras Selvagens está justamente em Dek (Dimitrius Schuster-Koloamatangi, o mais baixo Predador com “míseros” 1,93), cujas características talvez causem polêmica entre os fãs fundamentalistas, presos à ideia de que todo Predador é um caçador solitário, monossilábico e desprendido de convicções. Pois o roteiro escrito por Patrick Aison baseado numa ideia original de Trachtenberg, com quem trabalhou em A Caçada, desafia essa percepção ao mostrar o personagem enxergando o valor de uma parceria em potencial, por exemplo. É o que acontece quando ele encontra Thia, espécie de robô (ou “sintético”) interpretado por Elle Fanning. Inicialmente encarando a máquina como uma “ferramenta”, aos poucos ele se identifica com seus dramas e passa a aceitar a possibilidade de trabalharem juntos em prol de um objetivo em comum. O script, no entanto, é transparente desde o início ao sublinhar o fato de que Dek não é um Yautja comum, pelo contrário, sendo encarado por quase todos à sua volta como “defeituoso” justamente por essa mentalidade mais flexível comparada a de seus semelhantes, o que elimina um eventual “sacrilégio” da parte dos roteiristas.

Essa é apenas uma das estratégias empregadas para construir Terras Selvagens sobre o molde do cinemão hollywoodiano clássico, colocando um herói proscrito numa jornada de redenção, tal qual a produção majoritária de blockbusters, abraçando os efeitos colaterais de sua estrutura convencional (os diálogos mastigados são o ponto fraco da obra). E o longa-metragem não decepciona, seja pelos deslumbrantes efeitos visuais utilizados para darem vida aos diversos planetas que aparecem (todos com fauna e flora hostis de maneiras engenhosas), ou pelas ótimas sequências de ação claramente influenciadas pela visão do mestre James Cameron (O Exterminador do Futuro, Avatar) e seu uso objetivo da câmera lenta, vale apontar, dando destaque a elementos importantes do quadro ao invés de simplesmente soar como um floreio estético. Cameron, inclusive, é citado na seção de agradecimentos dos créditos finais.

Voltando à seara das surpresas, nunca foi tão divertido acompanhar os passos do Predador: enquanto os realizadores anteriores optavam por priorizar a tensão e a brutalidade, Trachtenberg permite ao público bem-vindos alívios cômicos, até suavizando a sisudez habitual do monstro. Nesse aspecto, a sequência da fogueira pode soar excessiva e dar razão a possíveis fãs xiitas quanto a iminentes danos à imagem do guerreiro extraterrestre, mas na maior parte do tempo contribui para tornar a atmosfera mais confortável ao espectador casual. Vale destacar ainda que é Elle Fanning a maior responsável por essa leveza até então inédita. E que belo ano está tendo a atriz de Super 8 (2011) e indicada ao Emmy pela série The Great (2020-2023), pois além de exibir carisma e versatilidade como a sintética Thia, a estadunidense já havia impressionado no excelente Valor Sentimental, um dos prováveis candidatos às principais categorias do próximo Oscar.

Culminando num final ainda mais empolgante do que os já envolventes dois atos anteriores, Predador: Terras Selvagens posiciona-se facilmente como a melhor continuação da franquia desde que esta foi iniciada em 1987 e com o bônus de apontar um futuro auspicioso para seu icônico protagonista.
NOTA 7,5









