Festival do Rio 2022 | Dia 6
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  • Foto do escritorGuilherme Cândido

Festival do Rio 2022 | Dia 6

Meu Filho é um Craque (Fourmi, 2019) | França


Théo (Maleaume Paquin) é um prodígio do futebol. Seu talento costuma salvar o seu time e é celebrado por todos, principalmente por seu pai Laurent (François Damiens), cuja única alegria na vida parece ser acompanhar o filho. Alcóolatra, ele passa longe de ser o pai perfeito, esquecendo de buscar Théo na escola e arrumando brigas durante seus jogos. Até que um dia, um olheiro do Arsenal, tradicional clube inglês, vai assistir a um jogo do time de Théo e se interessa pelas habilidades do menino, mas acaba desistindo da ideia de contratá-lo em virtude de sua baixa estatura.


No entanto, Théo vê a situação como a oportunidade perfeita para fazer seu pai mudar, pois devido ao fato de somente ele poder acompanhá-lo numa eventual carreira em Londres, devendo colocar sua vida nos eixos, especialmente abandonando a bebida. Théo, então, decide mentir, contando a todos que foi selecionado pelo olheiro, o que de fato acaba provocando uma série de mudanças em seu pai, orgulhoso do filho. Mas conforme a situação avança, o garoto passa a ter cada vez mais dificuldades para manter a farsa, dependendo da ajuda de um amigo hacker (Pierre Gommé) para falsificar e-mails do Arsenal, provocando uma bola de neve que coloca em xeque a capacidade de Théo em levar sua mentira adiante.


Convencional por natureza, o roteiro escrito pelo diretor Julien Rappeneau (em seu segundo longa-metragem), adaptado dos quadrinhos de Artur Laperla e Mario Torrecillas, adota uma estrutura esquemática que se apoia em clichês e convenções para construir o típico feel good movie, dependendo do carisma de seus personagens para conquistar o espectador. Ao final do primeiro ato, aliás, é possível prever todos os beats que se seguirão, pois Rappeneau não demonstra a menor intenção de fugir do básico.


Sua sorte é poder contar com atores extremamente simpáticos, especialmente Maleaume Paquin, que compõe Théo como um menino doce e cujo amor pelo pai é simplesmente irresistível, fazendo com que torçamos pelo sucesso de seu plano, mesmo sabendo os rumos que a história tomará a seguir. Enquanto isso, François Damiens, que brilhou no tocante A Família Bélier, comprova mais uma vez seu talento, encarnando o típico pai irresponsável, mas que não mede esforços para apoiar o filho. Confortável no papel, ele não tem dificuldades para retratar a forte ligação que Laurent possui com Théo, beneficiando-se também de uma química deliciosa com Paquin.


Com um elenco de apoio que inclui o sempre ótimo André Dussolier (Caixa Preta), o destaque fica por conta do jovem Pierre Gommé (A Chance de Fahim), que interpreta o hacker Max, personagem mais fascinante da produção em virtude de sua aparente agorafobia. É uma pena que o realizador não demonstre interesse em se aprofundar no drama de Max, limitando-se a referências superficiais (aquela envolvendo seu terapeuta) e sequências deslocadas (sua relutância em deixar o quarto).


Ademais, Meu Filho é um Craque possui o equilíbrio perfeito entre humor e drama, mesmo que as gargalhadas sejam mais esporádicas: contando com a direção confiante de Julien Rappeneau, que acertadamente foge do melodrama ao não pesar a mão nas cenas com maior potencial emotivo, a produção jamais deixa de oferecer uma experiência agradável. E mesmo que invista numa parcela problemática de diálogos expositivos, o que enfraquece irremediavelmente o final, por exemplo, graças a sequências artificialmente didáticas que mastigam várias informações para o espectador, os problemas de seu roteiro também são contornados por uma montagem que mantém o ritmo sempre ágil.


Causando estranheza por marcar presença num festival famoso pelo vanguardismo de sua curadoria, Meu Filho é um Craque esforça-se para se manter fiel a um público pouco exigente, conservador até, contentando-se com uma história feita sob medida para abrilhantar futuras sessões vespertinas.


NOTA 6


 

Derrapada (Idem, 2022) | Brasil


Apesar de ser baseado no romance Slam, de Nick Hornby, o mesmo autor de Um Grande Garoto e Alta Fidelidade, mas que também se aventurou como roteirista nos bem-sucedidos Educação e Brooklyn, Derrapada é um longa-metragem tipicamente brasileiro. Trazido para a realidade carioca, mais precisamente a das ocupações estudantis de 2015 e 2016, o filme dirigido por Pedro Amorim (Mato Sem Cachorro) utiliza o universo dos skatistas como pano de fundo para discutir um tema delicado: a gravidez na adolescência.


A trama segue Samuca (Matheus Costa) apaixonado por skate que vive com a mãe Melina (Nanda Costa), que carrega o peso de ter engravidado muito jovem e tenta evitar a todo custo que o mesmo aconteça com o filho. No entanto, Samuca acaba se envolvendo com a ativista estudantil Alícia (Heslaine Vieira), com quem mantém uma relação tórrida e que culmina numa inesperada gravidez. Aos 17 anos, Samuca vê seu futuro em risco, mas se recusa a deixar de apoiar Alícia, confrontando os pais da moça enquanto tenta se redimir com a mãe.


Despontando ainda criança, muitos devem lembrar de Matheus Costa em novelas como América (sua estreia na TV) e Cobras & Lagartos, esquecendo que o carioca também participou de filmes como o excepcional Aos Teus Olhos (premiado no Festival do Rio 2017) e o recente Carlinhos e Carlão. Beneficiado pelo rosto de menino, Costa interpreta Samuca como o típico adolescente relaxado, que ainda dá mais valor ao presente do que ao futuro, o que explica seu desapego a compromissos. Artista nato, quando é chamado para produzir um quadro que será usado durante uma ocupação estudantil, ele passa a conviver com Alícia. Idealista ao extremo, a moça recusa o rótulo de líder, afirmando que o Movimento Estudantil “é horizontal”, mas não hesita em fazer discursos inflamados e lutar por melhorias em sua escola, valorizando o trabalho de professores como Marcos (Felipe Rocha), que sofre com a sistêmica falta de reconhecimento por parte de sua classe.


Escrito pelo próprio diretor Pedro Amorim em parceria com Izabella Faya (Ernesto, o Exterminador de Seres Monstruosos e Outras Porcarias) e Ana Pacheco (Detetives do Prédio Azul), o roteiro é eficiente ao apresentar e desenvolver seus personagens, especialmente Alícia e Samuca, mas a narração gratuita e que frequentemente quebra a quarta parede para passar informações diretamente ao público, mostra-se uma opção preguiçosa e que segue uma triste tendência do Cinema Brasileiro.


Entretanto, o maior equívoco do filme é pesar a mão em seus discursos, soando panfletário e por vezes didático ao extremo, como na insistência em mostrar Alícia expressando a importância de se usar preservativo (com direito a plano-detalhe na embalagem). Falando nisso, Heslaine Vieira sofre com a obsessão dos roteiristas em transformar Alícia num estandarte político, transformando a personagem numa irritante caricatura que busca problematizar tudo o que ocorre à sua volta, entrando em discussões frequentes que só provocam a antipatia do público.


Do elenco secundário, destacam-se as presenças do sempre eficiente Augusto Madeira (A Menina Que Matou os Pais), que surge no papel de mais um coadjuvante que rouba a cena (aguardo ansiosamente por vê-lo como protagonista) e de Nanda Costa (Monster Hunter) que se beneficia imensamente da química com Matheus Costa, fazendo de Melina uma mulher forte e independente, mas também uma das figuras mais calorosas da produção, graças ao relacionamento leve que possui com o filho.


Além disso, o corrido terceiro ato demonstra uma falta de cuidado frustrante, quando o roteiro coloca determinado personagem para revelar o destino de cada membro de seu núcleo central, culminando numa série de diálogos expositivos que, de quebra, ainda mastigam a moral da história para o espectador. Uma pena, pois a montagem ágil aliada a uma linguagem estilosa (que inclui coloridas sequências animadas), oferece um ritmo sempre envolvente.


Contando com a luxuosa presença do carismático Felipe Rocha (do divertidíssimo La Vingança) e uma participação especial do skatista Bob Burnquist, Derrapada é claramente um veículo panfletário voltado para o público jovem, disfarçando suas intenções educativas com um protagonista simpático envolvido numa história que jamais deixa de ser interessante.


NOTA 5,5



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