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Foto do escritorGuilherme Cândido

Projeto James Bond #02: Moscou Contra 007 (1963)

Moscou Contra 007 (From Russia With Love, 1963)


Contando com um prólogo inventivo, mas que não deve ser subestimado (sua importância é sentida no terceiro ato), ao brincar com a possibilidade de James Bond ser assassinado ainda nos minutos iniciais, Moscou Contra 007 tem início apresentando as credenciais de seu vilão: embora vastamente superior ao prototípico Dr. No, o Grant de Robert Shaw não chega a ter força o bastante para encabeçar a lista de antagonistas mais marcantes da franquia, mas é concebido com estilo e peso dramático suficientes para funcionar dentro da narrativa. Nos filmes posteriores, aliás, fica claro que Grant teria sido um excelente capanga. Vale destacar que a performance de Shaw impressionou ninguém menos do que Steven Spielberg, que ao vê-lo em cena não hesitou em convidá-lo para interpretar o Capitão Quint de Tubarão.

A trama de Moscou Contra 007 também mantém os dois pés na realidade, ao evitar delírios megalomaníacos e apostar em motivações simples, mas tremendamente eficazes ao incorporarem o contexto da Guerra Fria. Com um decodificador servindo como MacGuffin (termo criado por Alfred Hitchcock para definir um objeto que move a trama ao despertar o interesse de todos os personagens), o filme coloca Bond em rota de colisão com a SPECTRE., organização que emprega os maiores nêmesis do agente britânico.

A organização, diga-se de passagem, serve como um contraponto mais do que apropriado ao MI6, algo reforçado pelos paralelos concebidos pelo roteiro: Assim como 007 se reúne com M para tomar ciência das diretrizes de sua missão, os agentes da SPECTRE se apresentam a uma figura cujo rosto ainda é um mistério, mas que chama a atenção por surgir em cena acariciando um gato branco. Número 1 da entidade, Blofeld mais tarde se revelaria o maior vilão da série.

Cacofônico ao resgatar elementos do filme anterior (Sylvia Trench e uma cicatriz), estabelecendo uma ponte entre as duas aventuras, Moscou Contra 007 não perde tempo e inicia várias tradições, como as divertidas interações de James Bond com Moneypenny, os briefings de M e o acesso às bugigangas de Q (agora definitivamente incorporado na pele de Desmond Llewelyn), sempre após os créditos iniciais, que aqui surgem mais sofisticados (fruto do orçamento turbinado), embora ainda sem uma canção original, marca registrada da série.

E por falar em tradição, o aliado de James Bond da vez, o turco Kerim Bey, se revela um dos mais carismáticos de toda a franquia. Infelizmente, sua presença teve de ser limitada, já que o mexicano Pedro Armendáriz, seu intérprete, sofria de câncer em estado terminal (contraído durante as filmagens de Sangue de Bárbaros numa área de testes nucleares). A produção foi obrigada a alterar o cronograma de gravações para adiantar as cenas de Sean Connery com Armendáriz, que um mês após concluir sua participação, tirou a própria vida num hospital de Los Angeles.

Atriz mais jovem a viver uma Bond Girl, Daniela Bianchi (Miss Itália três anos antes) não teve a sorte de contar com uma introdução tão icônica quanto a de Ursula Andress no filme anterior, mas é hábil ao tirar leite de pedra num papel superficial e concebido apenas como interesse romântico de Bond. É importante lembrar que a série, protagonizada por um homem que usa as mulheres como instrumentos de trabalho, sempre foi conhecida por negligenciar personagens femininas e Moscou Contra 007 não foge à regra. Há, inclusive, uma cena marcante com Bond estapeando a Tatiana Romanova de Bianchi. Outro ponto negativo é a inclusão de uma descartável passagem num acampamento cigano, fazendo com que a história pare a fim de mostrar uma moça fazendo a dança do ventre.

Aproveitando o clima leve da narrativa, Sean Connery deixa para trás a frieza exibida no filme anterior e oferece uma performance irreverente, repleta de bom humor graças a frases de efeito espirituosas, mas sem perder a elegância habitual. Nem mesmo as sequências de ação fazem o Bond de Connery perder a pose e o escocês cria um estilo próprio ao desferir golpes e disparar sua Walther PPK. Sua atuação chegou a ser exaltada até pelo autor Ian Fleming, que finalmente se convenceu de que ele era a pessoa certa para o papel, chegando a incluir uma ascendência escocesa a James Bond nos livros seguintes.

Abrindo espaço para um terceiro ato absolutamente espetacular, com direito a uma perseguição de barcos e outra que coloca um helicóptero no encalço de um James Bond a pé, Moscou Contra 007 possui sequências de ação mais frequentes (e explosivas), exibindo um ritmo ágil reforçado pela troca recorrente de cenários, dando uma sensação constante de movimento. E mesmo quando resolve se concentrar num espaço mais limitado (o interior de um trem), a produção presenteia o espectador com momentos de tensão e uma ótima luta travada por Connery e Shaw, que ganha contornos dramáticos graças ao prólogo citado no início do texto. Méritos não só para inspiradíssima coreografia, mas também para o diretor Terence Young, que aproveita cada espaço da cabine sem tornar a sequência confusa. Os elogios também devem ser estendidos à trilha sonora de John Barry, creditado pela primeira vez como compositor principal e que aproveita a oportunidade para estabelecer um padrão altíssimo de qualidade.

Encerrando a projeção com um gancho escancarado pelos créditos finais, que anunciam o retorno de James Bond e até o título da aventura seguinte (um costume que perduraria durante toda a fase Sean Connery), Moscou Contra 007 representa o auge da série, aprimorando todos os elementos apresentados em 007 Contra o Satânico Dr. No e convertendo-os numa aventura espetacular, justificando os recordes de bilheteria que quebrou na época de seu lançamento. Não é à toa que este seja o 007 favorito de tanta gente, incluindo o próprio Sean Connery.


NOTA 9

1 comentario


Jnei Cândido
Jnei Cândido
21 mar 2023

Excelente escolha .Qual "fÃ" de cinema não gostaria de conhecer segredos que envolvem o 007 e principalmente seus Atores ?


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