Roteiro simplório de "Adão Negro" é salvo pelo carisma de The Rock
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  • Foto do escritorGuilherme Cândido

Roteiro simplório de "Adão Negro" é salvo pelo carisma de The Rock


Na Hollywood dos tempos atuais, existem poucos astros capazes de construírem uma marca baseada em seus nomes, numa espécie de “subgênero próprio”. São atores que, por também produzirem seus filmes, possuem voz ativa em todas as etapas da produção. Tom Cruise, por exemplo, talvez seja o mais bem sucedido em implementar um estilo famoso por sequências de ação grandiosas onde, para a alegria da imprensa sensacionalista, é ele mesmo quem as faz, dispensando dublês.


Enquanto isso, Vin Diesel, menos arrojado e vários degraus abaixo de Cruise, adota um modelo mais tradicional, ancorado por tramas formulaicas (o interesse amoroso, a ação exagerada e os carros potentes são suas marcas registradas) girando em torno de sua persona marrenta. Enquanto Cruise, ao se cercar de alguns dos melhores profissionais da Indústria, é capaz de entregar obras que combinam roteiros cada vez melhores (méritos de sua parceria com o vencedor do Oscar Christopher McQuarrie) com a adrenalina que seu público cativo demanda, Diesel vem sofrendo com uma queda expressiva nos números de bilheteria de seus filmes.

Já Dwayne “The Rock” Johnson se posiciona como um meio-termo entre os atores/produtores supracitados. Não executa proezas físicas e nem possui colaboradores de talento expressivo, mas a fama de gente boa, fruto de aparições públicas sempre dominadas pela simpatia e pelo respeito com que trata seus fãs, fazem dele uma das figuras mais queridas de Hollywood. Facilita também o fato de Johnson ser um poço sem fundo de carisma, o que compensa suas limitações dramáticas.

Assim, o ex-lutador passou a fidelizar o seu público e a partir do momento em que percebeu que tinha fãs suficientes para garantir o sucesso de seus filmes, passou também a atuar como produtor, elaborando uma fórmula narrativa que abraça sua preferência por aventuras feitas para toda a família. Nasciam Terremoto: A Falha de San Andreas, Rampage: Destruição Total e Arranha Céu: Coragem Sem Limite, obras que ofereciam passatempos simples sempre chancelados pelo carisma arrebatador de seu protagonista. Adão Negro não é diferente, vindo do mesmo modelo de sucesso.

Com um prólogo saído direto de uma daquelas sessões de matinê, ficamos sabendo que a história começa em 2600 a.C., numa nação fictícia chamada de Kahndaq (uma versão alternativa do Egito), lar de uma sociedade dominada por um déspota impiedoso. Mas um escravo, Teth-Adam (Johnson), resolve se rebelar, sendo escolhido pelos mesmos magos vistos em Shazam! para receber poderes divinos a fim de consumar a libertação de seu povo. Entretanto, a fúria vingativa que derramou sobre o antigo rei, fez com que Teth-Adam fosse aprisionado. De volta ao presente, acompanhamos um pequeno grupo de caçadores de artefatos liderado pela idealista Adrianna (Sarah Shahi), que acaba libertando Teth-Adam de sua tumba.

A cena em que Teth-Adam desperta, aliás, é uma tremenda ilusão: baseando todo o marketing em cima da ideia de que Adão Negro é um anti-herói que não se importa em tirar vidas, o filme o apresenta desmembrando mercenários e eletrocutando corpos até derreterem e virarem esqueletos facilmente quebráveis, em momentos que impressionam por estarem num filme de super-herói classificado para maiores de 13 anos. O problema é que essa violência não é mantida e Adão Negro faz questão de firmar seu pé no território infanto-juvenil, quando permite a entrada do adolescente Amon (Bodhi Sabongui) com o claro objetivo de suavizar o protagonista e, por consequência, a história.

Investindo numa dinâmica que remete imediatamente ao clássico O Exterminador do Futuro 2: O Julgamento Final, a produção coloca The Rock, mais uma vez, para interagir com um jovem (algo recorrente em sua filmografia), responsável por ensinar frases de efeito ao anti-herói e apresentá-lo ao conceito super-heróico, fazendo as vezes do espectador fã de quadrinhos (seu quarto é repleto de pôsteres e action figures de personagens da DC Comics). Leve, a relação entre Adão Negro e o deslumbrado skatista é desenvolvida apenas superficialmente, buscando também uma conexão maior com o público. Nesse caso, é preciso ressaltar que o principal ponto negativo do filme reside justamente nas subtramas envolvendo os humanos, e o excesso de personagens não ajuda.

Com isso, o roteiro de Adam Sztykiel (colaborador de The Rock em Rampage: Destruição Total) e a dupla Rory Haines e Sohrab Noshirvani (de O Mauritano), toma para si um tremendo desafio que reside em dividir seus quase 120 minutos de projeção entre uma gama considerável de heróis e vilões sem deixar escapar o protagonismo de sua estrela. O resultado, como era de se imaginar, não é bom, pois além de perderem o foco, os roteiristas jamais atingem o objetivo de fazer com que nós nos importemos com aquelas figuras, o que é uma pena. Entretanto, num universo pautado pela simplicidade, o trio se sai relativamente melhor ao abordar o significado de ser um herói, aproveitando para justificar o contraponto representado pelo próprio Adão Negro, um anti-herói por excelência.

Vivido com surpreendente disciplina por Dwayne Johnson, fã declarado do personagem, Adão Negro é uma figura que atrai, com facilidade, a simpatia do espectador, principalmente por conta do showman que seu intérprete provou ser. Entretanto, embora seja mais fácil apontar a dificuldade do ex-lutador em expressar emoções genuínas, vê-lo com um traje super-heróico voando e lançando raios com as mãos enquanto arrebenta vilões soltando frases de efeito provoca um prazer quase infantil. Até porque, o diretor Jaume Collet-Serra (outro colaborador de Johnson, em Jungle Cruise), é hábil ao elaborar sequências de ação que se concentram basicamente na figura do ator.

Por outro lado, o excesso de câmera lenta mostra que Zack Snyder, ex-consultor criativo do chamado “Universo DC”, exerceu imensa influência na forma como Collet-Serra concebeu os inúmeros combates vistos aqui. Aqueles que não integrarem o grupo de detratores do estilo Snyder, todavia, poderão se divertir com set-pieces nada extraordinários, mas que possuem estilo o bastante para se distanciarem do espetáculo medíocre de CGI promovido pela concorrência.

Apesar do roteiro simplório, Adão Negro torna-se um passatempo agradável especialmente por se concentrar na persona magnética de Dwayne "The Rock" Johnson, o que talvez não seja o bastante para agradar à base de fãs dos quadrinhos, que dessa vez pelo menos poderá alimentar esperanças quanto ao futuro da DC, não apenas pelo empenho da Warner em encontrar um caminho para fazer de seus super-heróis a galinha dos ovos de ouro do estúdio, mas também pela empolgante (e imperdível) sequência pós-créditos que o projeta.


NOTA 6

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