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CRÍTICA | "Balada de um Jogador"

  • Foto do escritor: Guilherme Cândido
    Guilherme Cândido
  • há 2 dias
  • 3 min de leitura

*Crítica publicada durante o Festival do Rio 2025


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Antes de dirigir Nada de Novo no Front (2022) para a Netflix, o alemão Edward Berger era um diretor pouco expressivo até mesmo na Alemanha, seu país de origem. Mesmo assim chegou em Hollywood sem medo de ser o tipo de mão de obra contratada pelo qual executivos de grandes estúdios salivam. Comandou episódios de séries de televisão como Patrick Melrose (2018), The Terror (2018-2025) e Your Honor (2020-2023), mas aí veio o Oscar 2022 e o resto é história. Hoje, Berger é um diretor de primeira prateleira, vindo de outro grande filme vencedor do Oscar (Conclave). Sua carreira evoluiu a ponto de finalmente se tornar o tipo de diretor que é cogitado para praticamente toda grande produção, de 007 a Bourne. Talvez por isso ele se sinta confortável para comandar um projeto tão arriscado como este A Balada de Um Jogador.


Diferente de tudo o que já dirigiu, a adaptação do romance de Lawrence Osborne é exagerada, chamativa, obtusa e, em última instância, magnética, impossível de deixar de acompanhar, como uma dose entorpecente cujo efeito dura cerca de uma hora e quarenta minutos.

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Berger despe-se do formalismo solene de seu filme anterior e entrega-se a movimentos de câmera arrojados, ângulos holandeses, mudanças de foco e toda a sorte de ferramentas gráficas para transformar o primeiro ato numa espécie de purgatório inebriante, de certa forma espelhando o momento vivido pelo protagonista autointitulado “Lorde” Doyle.

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O projeto jamais daria certo caso o ator principal não estivesse em sintonia com o tom narrativo e Colin Farrell abraça o over de modo a se tornar o cúmplice perfeito para os delírios estéticos de Berger. O sotaque falso, os movimentos oculares frenéticos, os diálogos intensos proferidos em direção ao nada. Tudo o que o irlandês indicado ao Oscar por Os Banshees de Inisherin (2022) faz está um grau acima do normal e como A Balada de um Jogador é tudo, menos normal, sua composição não é menos do que adequada.

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Rowan Joffe, que diferentemente de Edward Berger ainda não se desvencilhou dos projetos inexpressivos, faz uma adaptação com fortes ecos do Inferno de Dante, do qual Doyle só escapará após se redimir, assumindo seus erros e suas fraquezas. O apostador viciado em segundas chances terá de suspender sua fuga do passado para superar uma maré de azar metaforicamente espiritual.

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O fato de Macau ser retratada como um oásis multicolorido, uma Las Vegas oriental pronta para receber jogadores renegados, ajuda a confundir nosso anti-herói, que não percebe ou não quer aceitar a realidade dura e ao mesmo tempo alucinógena na qual se encontra. Para ele, o inferno verdadeiro é aquele que se apresenta no segundo ato, quando a fotografia de James Friend, responsável por um dos quatro Oscars de Nada de Novo no Front (2022), drena todas as cores supersaturadas e adota uma paleta fria e monótona. Até a direção se obriga a desacelerar, substituindo o frenesi por uma calmaria enervante.

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No romance original, talvez as reviravoltas sejam surpreendentes e/ou catárticas, mas aqui são telegrafadas com uma elipse de distância. Surpresa mesmo, só a participação pequena, mas crucial, de uma Tilda Swinton camaleônica como de hábito, personificando o passado que Doyle deverá confrontar para de fato se tornar digno de uma redenção, esta por sua vez refletida na presença fantasmagórica da chinesa Fala Chen como o interesse amoroso do protagonista.

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Quando a trilha sonora absurdamente ostensiva de Volker Bertelmann enfim dá uma trégua a nossos ouvidos, é sinal de que o desfecho se aproxima. Um que faz jus à figura trágica tão diligentemente interpretada por Farrell, mas que chega após dois potenciais finais desperdiçados. Edward Berger perde dois match points, mas ganha o jogo. Para quem começava a se acostumar com sua performance arrasadora, surpreende que tenha suado desta vez, mas arriscar-se também é saudável, especialmente como estratégia preventiva ante um duro oponente como a zona de conforto.


NOTA 7



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