Novo 'Quarteto Fantástico' supera antecessores, mas isso não significa muito
- Guilherme Cândido
- 23 de jul.
- 4 min de leitura

É fácil constatar que Quarteto Fantástico: Primeiros Passos é o melhor filme sobre a Primeira Família dos quadrinhos da Marvel, mas isso não quer dizer muito. Além de uma famigerada versão produzida a fórceps por Roger Corman em 1994 (que de tão ruim sequer foi lançada oficialmente), Reed Richards, Sue Storm, Ben Grimm e Johnny Storm reapareceriam em outras duas tentativas de consolidá-los também nos cinemas. A primeira, vinte anos atrás, reuniu o pior elenco possível para interpretar o quarteto. Ok, Chris Evans, embora irritante em muitos momentos, passava longe de ser um vácuo de personalidade como Ioan Gruffudd e exibia um mínimo de talento, ao contrário da inexpressiva Jessica Alba. Michael Chiklis pouco podia fazer além de falar “Tá na Hora do Pau” e Julian McMahon, caricatural, foi brutalmente sabotado pelo fraquíssimo roteiro. A Fox ainda insistiu numa continuação, mas a bilheteria abaixo do esperado enterrou os planos de fechar a trilogia. Tentando se redimir, o estúdio apostou num grupo recheado de jovens promessas de Hollywood, incluindo Michael B. Jordan (do recente Pecadores) e Miles Teller (o Rooster de Top Gun: Maverick), mas problemas nos bastidores deram um indício da catástrofe que chegaria aos cinemas em 2015.

Curiosamente mantendo a tradição de invadir as telonas em anos terminados em 5, um novo Quarteto Fantástico chega ao público neste fim de semana envolto em expectativas, especialmente pela chancela Marvel, tendo importância considerável no plano de restruturação do combalido MCU. E repito: apesar de representar uma óbvia evolução, o sarrafo da franquia sempre foi baixo.

A aposta nem precisava ser alta, mas o chefão Kevin Feige não brinca em serviço. Cercou-se de talentos comprovados e nomes consagrados, como o onipresente Pedro Pascal (escalado em cinco produções só esse ano) e o premiado Ebon Moss Bachrach (da série The Bear). Vanessa Kirby, indicada ao Oscar pelo inquietante Pedaços de Uma Mulher (2021) e famosa pela Viúva Branca da franquia Missão: Impossível, traz credibilidade e Joseph Quinn, tão magnético no fenômeno Stranger Things, exala carisma no papel de Tocha Humana. Quinn, aliás, é inteligente ao evitar seguir o papel de palhaço imortalizado por Chris Evans, apostando numa abordagem mais sóbria, embora consequentemente menos marcante.

E esse é um problema que acaba acometendo toda a produção, pois, por melhores que sejam as intenções e convicções da produção, Primeiros Passos é um filme sem brilho, como se fosse concebido sob medida para integrar uma engrenagem sem comprometê-la. A Marvel ressuscita aquele velho problema de converter suas obras em longos e caros trailers, sempre gerando expectativa para o próximo produto a ser consumido por seus fiéis clientes. Quarteto Fantástico não apenas segue diligentemente essa diretriz, como se encaixa com perfeição no quebra-cabeças a ser formado: o próximo Vingadores.

Assim, gasta-se um tempo precioso regurgitando dinâmicas (o vilão cuja presença precisa ser construída, o terreno preparado para o “headliner” da atual “fase”, a surfista e seus desdobramentos) e reciclando clichês (uma pessoa inteligente sempre tem de ser vista fazendo cálculos num quadro negro...), sobrando pouco espaço para o encantamento. Aliás, a frieza com que a narrativa é desenvolvida (por um quarteto, veja só), entregando-se a introduções e diálogos redundantes, revela um projeto excessivamente preocupado em ser compreendido. Não como filme (ou aventura independente), mas como parte de um todo previamente estabelecido e prestes a ser sacudido pelo retorno de Robert Downey Jr., agora como vilão.

Para uma história focada em celebrar os laços entre seus personagens, surpreende a indiferença que tende a despertar no espectador. Lançado duas semanas depois de Superman, é difícil não lembrar da forma com que James Gunn foi capaz de humanizar o herói da concorrência e trazê-lo para junto de seu público. Embora as risadas tenham sido frequentes, as lágrimas também marcaram presença nas abarrotadas sessões do primeiro capítulo do novo DCU. Simplesmente porque nos importamos com Clark Kent e suas ligações afetivas. Em Quarteto Fantástico: Primeiros Passos, o medo de errar leva a equipe de roteiristas a se apoiar no óbvio. Na pior das hipóteses, sempre é possível apelar, mas aí o fator Marvel pesa e refrata o choque de um evento nos minutos finais.

A seu favor, jogam os efeitos visuais e o design de produção, competentes em tornar este reboot mais consistente em relação a seus antecessores. Falta uma sequência de ação memorável, é verdade, como a perseguição do Tocha ao Surfista Prateado no filme de 2007, mas ao menos o clima leve e as baixas pretensões não ofendem. Falando nisso, os furos assustadores presentes nas produções da Fox, felizmente, deixam de ser realidade. O que fica, no entanto, é uma trama simplória, um fiapo de história que mais parece servir de desculpa para introduzir elementos que ganharão importância no futuro. E não bastasse a fragilidade narrativa, os roteiristas ainda mastigam toda a trama, superestimando a complexidade do texto.

Beneficiando-se de mais uma trilha sonora emocionante do sempre excepcional Michael Giacchino, Quarteto Fantástico: Primeiros Passos já entra em campo com o jogo ganho, o que facilita imensamente sua missão de dar partida no próximo grande veículo do Universo Marvel.
Observação: Há duas sequências adicionais durante os créditos.
NOTA 5,5