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Foto do escritorGuilherme Cândido

Excessos ofuscam sensibilidade de 'Todos Nós Desconhecidos'

Crítica publicada durante o Festival do Rio 2023


Na época em que a conta oficial do Festival do Rio fazia pesquisas para saber os filmes internacionais que o público gostaria de ver a partir do dia 5 de outubro, All of Us Strangers (na época sequer possuía título em português) era quase uma unanimidade, aparecendo entre os pedidos de praticamente todos os que respondiam. Isso quando não encabeçava as listas.


Especulado como uma das produções no radar do Oscar em virtude de sua aclamação junto à Crítica, o novo longa-metragem de Andrew Haigh (do engenhoso 45 Anos) parece ter caído no gosto popular muito antes do que deveria, ocasionando um aumento exponencial de expectativa. Como sempre digo, a expectativa é a mãe da frustração e por isso prefiro entrar na sala de projeção sabendo o mínimo possível e apenas torcendo para que seja bom. Quando as luzes se acenderam no estonteante Cine Odeon na noite do feriado de 12 de Outubro, um vozerio tomou conta das fileiras abarrotadas. Enquanto muitos se mostravam decepcionados, outros limitavam-se a dizer que a experiência oferecida foi diferente daquilo que esperavam.

Uma pena, pois é desonesto com a obra (qualquer uma, na verdade), atribuir uma cotação baixa apenas pela altíssima expectativa criada em torno dela, assim como seria igualmente injusto conceder uma boa nota a um filme do qual pouco se esperava. No meu caso, Todos Nós Desconhecidos chega, sim, a funcionar, mas longe de se enquadrar em algum extremo.

A história de Adam (Andrew Scott), um roteirista solitário que acaba se aproximando do único vizinho que possui no imenso prédio em que reside, se desenvolve com dois pés na fantasia. Logo no início ficamos sabendo que ele, mesmo depois de décadas, ainda ressente a morte prematura dos pais, algo que acaba fazendo com que ele visite esporadicamente a casa onde cresceu. Surpreendentemente, ele os encontra (exatamente como eram) e vislumbra a oportunidade de conversar sobre tudo o que o acidente de carro lhe impossibilitou de mencionar. Nesse meio tempo, ele estreita os laços com Harry (Paul Mescal), com quem passa a frequentar boates e trocar confidências no silêncio das madrugadas.

Conhecido por papéis mais verborrágicos e expansivos, como o padre de Fleabag, o Moriarty de Sherlock e o C de 007 Contra SPECTRE, Scott compõe Adam como um homem profundamente sensível, embora consciente de sua natureza solitária. Em paz com a vida que passa a levar, ele entra em conflito com os ideais conservadores da mãe (Claire Foy, de Entre Mulheres) e encontra um meio-termo com o pacífico e compreensivo pai vivido por Jamie Bell (Sem Remorso). Eficiente, ele encara o protagonismo com naturalidade, exibindo relativa química com Paul Mescal.

Lançado ao estrelato após a performance arrebatadora no excelente Aftersun, Mescal opta por canalizar sua energia na personalidade de Harry, muito mais forte e extrovertida do que a de Adam. Harry, no entanto, é apenas um instrumento utilizado pelo roteiro para encorpar a trama envolvendo o protagonista, visto que temos poucos vislumbres do verdadeiro Harry.

Embora claramente concebido para arrancar rios de lágrimas do espectador, Todos Nós Desconhecidos falha justamente graças à condução frouxa de Andrew Haigh, cineasta que confia demais no calor humano exalado pelos dois homens. E mesmo quando algumas surpresas irrompem no terceiro ato, ao espectador cabe apenas uma reação neutra, aceitando o destino mais lógico que caberia a Adam. A intrincada estrutura (mais uma...) busca oportunidades para colar as sequências fantasiosas com aquelas que incluem Harry, mas a frieza da direção de Haigh influencia diretamente no resultado.

Pecando também por incluir planos espetacularmente cafonas nos últimos instantes de projeção, trata-se de um filme longe de ser ruim, mas ainda mais longe de ser o que seus ansiosos e passionais espectadores aguardavam. O que diz muito menos sobre o filme do que dessa parcela do público.


NOTA 7

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