Projeto James Bond #20: 007 Um Novo Dia Para Morrer (2002)
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  • Foto do escritorGuilherme Cândido

Projeto James Bond #20: 007 Um Novo Dia Para Morrer (2002)

007 Um Novo Dia Para Morrer

(Die Another Day, 1997)


Antes de fazer essa maratona de revisões dos filmes da série 007, eu costumava dizer que Pierce Brosnan era um ótimo Bond, mas que não era ajudado pelas aventuras que estrelou. Para efeito de comparação, se o péssimo George Lazenby ficou marcado por protagonizar um dos mais singulares exemplares da franquia, a era Pierce Brosnan gerava a ilusão de jamais recompensar os esforços de sua estrela. Uso o pretérito perfeito, pois apesar de achar GoldenEye menos do que a grande estreia que me senti compelido a cravar na época em que vi (durante a adolescência, então mereço um desconto), O Amanhã Nunca Morre representou uma experiência bem melhor desta vez. Dentre as quatro produções encabeçadas por Pierce Brosnan, apenas suas duas últimas mantiveram-se intactas no meu conceito, mas se O Mundo Não é o Bastante permanece um capítulo medíocre, 007 Um Novo Dia Para Morrer não apenas continua ruim, como me sinto ainda mais seguro em defender a tese de que se trata do pior de toda a série. Sim, considero 007 Contra o Foguete da Morte, 007 Contra o Homem Com a Pistola de Ouro e 007 Os Diamantes São Eternos superiores à saideira de Brosnan, o que não deixa de ser uma imensa decepção.

Pois mesmo que tenha deixado uma impressão ruim ao se despedir, Brosnan ainda era capaz de cativar com seu carisma natural e me surpreende que não tenha sido chamado para mais uma ou duas continuações, pois seu vigor físico seguia incólume. Na verdade, ao assistir a este 007 Um Novo Dia Para Morrer, tudo fica claro e é até possível imaginar os produtores coçando a cabeça diante de absurdos que fariam os filmes de Roger Moore parecerem realistas. Afinal, por mais exageradas e fantasiosas que fossem as aventuras do Bond da década de 80, jamais deixávamos de sentir a identidade do personagem, que invariavelmente servia para reagir com bom humor aos disparates que se avolumavam ao seu redor, como se ele nos encorajasse a não levar a história a sério.

O que impede Um Novo Dia Para Morrer de ser meramente ‘assistível’, como as besteiras ridículas que citei no final do primeiro parágrafo, é o descolamento completo que os roteiristas Neal Purvis e Robert Wade (que seguem na franquia até hoje) promovem da história em relação à essência de James Bond, agora transformado num herói de ficção científica que pilota um carro invisível e enfrenta inimigos que se escondem numa fortaleza de gelo. Aliás, se tirarmos o espião da jogada, é fácil confundir a história desse filme com a de um super-herói qualquer.

Não bastasse o desperdício de potencial de um vilão que não sentia dor (ignoremos a bobagem do fortalecimento) durante o capítulo anterior, agora estamos diante de personagens que usam trajes tecnológicos equipados com armas elétricas (qualquer semelhança com o Darth Sidious de Star Wars é mera coincidência) e que “transplantam DNA”, mesmo que a mudança completa de face não seja exatamente uma novidade dentro da franquia (vide Blofeld em Os Diamantes São Eternos).

E por falar em novidade, Purvis e Wade até buscam agradar os fãs de longa data ao incluírem uma série de referências ao passado do agente secreto e a tradicional sequência com Q se transforma numa enxurrada de easter eggs através da participação de objetos marcantes como a mochila a jato de 007 Contra a Chantagem Atômica, o sapato equipado com uma faca retrátil de Moscou Contra 007 e o mini submarino disfarçado de crocodilo visto em 007 Contra Octopussy. O que não desculpa a aberração inacreditável que se apresenta logo em seguida na forma de um Aston Martin dotado de “camuflagem adaptativa”.

A homenagem ao avião da Mulher-Maravilha não é a única ideia constrangedora da produção, que ao contratar o neozelandês Lee Tamahori, um cineasta acostumado a filmes de ação medíocres como Na Teia da Aranha e Triplo X 2 e contando com o razoável O Vidente como seu maior acerto, investe num pacote técnico que inclui uso excessivo de tomadas em câmera lenta (cafoníssimas por sinal) e uma capacidade extremamente limitada de extrair boas performances de seu elenco, com exceção de Toby Stephens, cujo vilão realmente não tinha salvação (até Daniel Day-Lewis teria dificuldades para torná-lo interessante).

O filho da britânica Maggie Smith (a eterna professora McGonagall de Harry Potter), contenta-se com expressões de desprezo e olhos semicerrados, investindo aqui e ali em sorrisos que deveriam enriquecer sua relação com Bond, mas que no final só o transforma no tipo mais genérico e desinteressante que costuma prejudicar a franquia vez por outra. E seu capanga vai pelo mesmo caminho, com Rick Yune sendo sabotado por uma maquiagem pedestre que parece tê-lo tirado de um filme b dos anos 70. Nem mesmo o confronto com James Bond é bem aproveitado, sendo vítima de uma carência de ideias que afeta até o sacro setor das bond girls.

Enquanto Rosamund Pike, estreando em Hollywood, corta um dobrado para fazer de Miranda Frost mais do que uma homenagem barata a Pussy Galore (me perdoem pela heresia da comparação), Jinx se revela uma versão genérica de outras parceiras de James Bond, cujo único apelo é ser interpretada pela sempre fascinante Halle Berry (além de entrar em cena referenciando a Honey Ryder de Ursula Andress em 007 Contra o Satânico Dr. No, (com direito a faca na cintura), aqui desfrutando do ápice de sua carreira no mesmo ano em que se tornou a primeira negra a levar para casa a estatueta de Melhor Atriz Coadjuvante, por A Última Ceia (dirigido por Marc Forster, que ironicamente participaria da série ao comandar 007 Quantum of Solace).

E não dá para comentar sobre a despedida de Pierce Brosnan sem levar em conta a última atrocidade cometida pela produção, que foi a escolha da canção “Die Another Day” para embalar a inovadora abertura (que dessa vez funciona no desenvolvimento da história). Nada contra Madonna, que não é a Rainha do Pop por acaso, mas o estilo eletrônico que traz consigo simplesmente não combina com a série. Já houve tentativas de dar um ar moderno a aberturas anteriores e “A View to a Kill”, da banda Duran Duran, talvez seja o caso mais bem-sucedido, mas apesar de compreender as intenções dos produtores, é impossível ignorar o fato de que a canção está tremendamente deslocada em relação às outras. Madonna, inclusive, faz uma breve participação no filme.

Por fim, cabe uma menção desonrosa para os desastrosos efeitos visuais empregados na sequência em que James Bond surfa uma onda gigantesca proveniente da queda de uma geleira derretida pela arma de raios solares do vilão (sim, é esse nível de absurdo), com o boneco digital do espião sendo alternado por um plano fechado de Pierce Brosnan claramente a frente de uma tela verde. Ademais, nem vale a pena tentar entender o motivo de M e seus funcionários não evacuarem o prédio em que estão mesmo sabendo que estão prestes a serem atingidos pela tal arma.

Dizem as más línguas que 007 O Mundo Não é o Bastante foi tão ruim e desviou a série para tão longe do prumo, que os produtores não tiveram escolha senão efetuarem uma nova reformulação, sacrificando o ator mais equilibrado a interpretar James Bond desde o insuperável Sean Connery. Um preço alto a se pagar, mas que valeu a pena ao considerarmos que gerou logo na sequência 007 Cassino Royale e toda a fase de Daniel Craig. Realmente há males que vêm para o bem.


NOTA 3,5


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